terça-feira, 10 de agosto de 2010

Declaração Massiva e Pública de Negação Ao Serviço Militar Obrigatório

Eis um texto de anarquistas gregos sobre o serviço militar obrigatório.

Apesar de ser um texto de um país europeu, é simples ver que ele se encaixa em qualquer território deste planeta, líderes mundiais usam exércitos para subjugar, dominar e destruir povos e culturas inteiras a milhares de anos, hoje em dia, a matança da guerra tem um novo nome, Missão de Paz e Missão Humanitária.


Abaixo, o texto na íntegra:



Digamo-lo de uma maneira simples. Não nos agrada fazer a mili [serviço
militar obrigatório]. Não queremos o exército seja para quem for nem para
nada. Repudiamos este mecanismo de poder, de hierarquia, de disciplina
total, de estupidez, de trituração da personalidade, da diferenciação, da
particularidade. Um mecanismo que existe para exercer a violência sobre os
outros, assim como sobre os mesmos “participantes” dele.

Estamos conscientes do papel que ocuparam os exércitos como assassinos ao
longo da história, seja como conquistadores, forças de ocupação ou
ultimamente como “forças de paz” e/ou “missões humanitárias”. Estamos
conscientes também das medalhas do “nosso” exército. Do seu papel nas
ditaduras, tanto antes da 2ª guerra mundial, como durante a ditadura de
1967-1974 na Grécia. Das suas missões internacionais na Ucrânia, na
Coréia, na Bósnia, no Kosovo, no Afeganistão...

Se existe algum significado na palavra pátria, certamente é ódio pelo
vizinho turco, da macedônia ou albanês… Sejamos trabalhadores, estudantes
ou desempregados, somos forçados a engolir as bobagens sobre o respectivo
interesse nacional, que estão servindo os mais ricos e a casta militar da
Grécia (ainda que neste país a milicada seja débil e cada vez mais
desvalorizada). E para nós tá claro, a frente de confrontação que
escolhemos é contra o nosso patrão, contra o político vigarista que nos
governa, contra os capitalistas do país que nos exploram e riem das nossas
caras, contra todo o tipo de fascista da porta ao lado...

Ficamos putos com os gastos militares¹. Há dez anos que terminamos a
escola, muitos já se formaram em uma dessas faculdades gregas,
pouquíssimos conseguiram entrar no mercado de trabalho. Também não
esquecemos das carências dos professores, as infra-estruturas inexistentes
assim como os livros, em geral a falta de possibilidades profissionais...
Já sentimos na pele o terrorismo do salário mínimo, do fardo de saber se
vamos ou não buscar bônus no serviço social, já que nos deu muito trabalho
superar a insegurança de ter ou não ter trabalho. Ao mesmo tempo, mais
aviões militares voam cada vez mais alto e os navios de guerra navegam
cada vez mais longe. Nenhum merda ou milico babão que fale dos inimigos da
nação pode nos convencer da necessidade destes armamentos, destes gastos,
sendo certo que o dogma “se queres a paz, prepara-te para a guerra” é uma
das coisas mais doentias pensadas pelo cérebro humano.

Como é duro engolir o tal chamado papel social do exército. Um capítulo
mais na forma linear da nossa vida. Um ano fora do mundo, longe de todos
os que amamos, de tudo o que fazemos, das nossas lutas. E isto porque “as
experiências do exército são insuperáveis”, ”o ambiente é fantástico” (só
tristeza nos dão estas frases) e, sobretudo porque nos vão transformar em
homens! Mas se o estado de ser homens é o que vocês são, fiquem sozinhos.
Nós permaneceremos crianças, assim podemos buscar a nossa faceta feminina,
ou qualquer outra.

Que sentido tem se não sairmos a gritar?

Sentimo-nos solidários com qualquer pessoa que se negue a integrar-se no
aparato militar, que ponha em dúvida o serviço militar obrigatório, com
sua ausência ou com qualquer outra atitude diferente ou alternativa.
Sentimo-nos solidários com os que burlam o exército e saltam do barco ou
escolhem outro barco. Já é tempo de recusarmos o exército politicamente,
em público, como é devido. Acreditamos que é necessário romper o silêncio
sobre este tema, criar uma ruptura no pensamento servil de que “assim são
as coisas”... É necessário falar explicitamente da abolição do serviço
militar obrigatório (pensando na eliminação do exército em si),
repudiando-o diretamente, rechaçando todo o direito do Exército e do
Estado para impô-lo. Deixemos claro e inegociável o nosso direito à
consciente e comprometido uso do tempo, do estado de ânimo, do
conhecimento e de qualquer capacidade nossa às ações sociais e aos setores
sociais que priorizamos, compreendendo melhor que qualquer aparato
hidrocéfalo de como podemos ser úteis...

Estamos contentes e animados com a nossa rede, e com a decisão espontânea
de marcharmos de mãos dadas. Temos nos encontrado e estamos reunindo
disponibilidades e forças para marchar, não como vocês gostariam, como
algumas pessoas perdidas no presente e no caos dos acontecimentos, mas
como coletividades, pequenas ou maiores, com solidariedade e confiança
mútua, com um discurso agressivo e claro.

Nas listas de serviço militar obrigatório de maio e agosto de 2010, alguns
de nós não vão comparecer nem vamos nos esconder. Vamos pôr roupas de
verão e não uniformes, vamos a um acampamento e não a um quartel. Estamos
conscientes das possíveis conseqüências e assumimos totalmente a
responsabilidade da nossa escolha, recusamos veementemente nosso destino
militar, mantendo intacta a nossa identidade política e social.

Maio de 2010.

Atenas, Tessalônica, Ioannina, Corinto...

[1] A Grécia é o país europeu que, nos últimos tempos, mais investiu em
armamentos. Seu exército é um dos mais numerosos e mais bem equipados da
Europa, na comparação com sua população (11 milhões de habitantes).